Medicamento contra a obesidade com aplicações mensais traz resultados significativos em estudo de fase 1
Em 30 semanas, o remédio gerou uma redução de peso de 17,1%, com a vantagem de não precisar de doses diárias. Quais os próximos passos?
Durante o Congresso Europeu de Diabetes em Madri, na Espanha, a empresa chinesa Beijing QL Biopharmaceutical apresentou dados preliminares, de fase 1, de um medicamento chamado ZT002 contra a obesidade. Sim, provavelmente o nome dessa molécula vai mudar, se ela virar um tratamento de fato.
Independentemente do apelido, o ZT002 é um agonista do receptor GLP-1 e, portanto, um “primo” do Ozempic. Como seu familiar, ele inibe a fome e promove saciedade.
O diferencial do ZT002 é sua capacidade de se ligar fortemente a uma das proteínas do sangue, a albumina. Com isso, a duração do seu efeito se estende, a ponto de ter sido testado com aplicações subcutâneas de até 30 dias de intervalo.
Assim como o Ozempic, o ZT002 é administrado inicialmente em doses menores, com aumentos graduais até atingir a quantidade plena. No estudo em questão, o tempo da dose inicial do medicamento até a dose completa foi de 14 semanas.
A partir daí, foram feitas as aplicações máximas mensais. O total de participantes da pesquisa foi de 36 pessoas. Todas eram asiáticas e possuíam excesso de peso ou obesidade – mas não carregavam diabetes.
Ao final das 30 semanas, a redução de peso foi de 17,1%. Uma pesquisa como essa não permite fazer comparações com outros fármacos, mas, só para entender a magnitude do resultado, o Ozempic gera, em média, um emagrecimento de aproximadamente 13-14% nas mesmas 30 semanas em pessoas sem diabetes.
Um ponto a destacar está no fato de que, ao término do acompanhamento do estudo, o gráfico de peso ainda apontava para baixo, sem atingir um platô. Em outras palavras, parece que, se houvesse um seguimento mais prolongado, a redução de peso seria maior.
Os efeitos colaterais mais comuns do ZT002 foram náuseas, vômitos e constipação intestinal, em geral de intensidade leve a moderada – e de caráter transitório. Nenhuma reação adversa grave foi detectada.
Apesar de ser um estudo inicial, encaro com bons olhos os resultados em termos de eficácia e também de segurança.
Um dos grandes problemas enfrentados pelo Brasil quanto ao uso de agonistas de receptor de GLP-1 é o engajamento dos pacientes. Há, de antemão, a questão do custo.
Além disso, as aplicações subcutâneas frequentes (diárias ou semanais) podem afastar algumas pessoas. Já nas versões orais, o desafio é tomá-las sempre em jejum, meia hora antes de se alimentar, sem nenhum outro medicamento em conjunto nesse período.
Nesse cenário, uma aplicação mensal teria tudo para colaborar no maior engajamento das pessoas a um tratamento antiobesidade, que deve ser crônico e sempre associado a hábitos de vida saudáveis.
Expectativas foram criadas com o ZT002. Vamos aguardar a evolução da ciência nesse campo, com estudos maiores e mais longos.
30 de setembro de 2024
,Carlos Eduardo Barra Couri
Médico endocrinologista e curador do Portal Olhar da Saúde.